terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Renúncia



Olho à frente e não vejo o futuro. O hoje é o passado de amanhã: vivemos no pretérito. Hoje colhemos as decepções e amarguras de tudo o que poderíamos ter realizados e não o fizemos. Deixamos para depois, sem perceber que o depois é agora. Estamos no depois. Depois de tudo o que passamos, depois de tudo o que passou por nós. Todas as oportunidades desperdiçadas. Tantos sonhos mortos, meu pai.

Em que momento renunciamos e nos deixamos arrastar pela vida cabisbaixos, pensativos no que poderia ter sido, e não foi? Parece-me que morrer não é deixar de viver. Morrer é, antes de tudo, deixar de sonhar, que antes de ser uma morte, é uma traição: é trair-se a si mesmo, condenando-se a morte todos os dias.

Somos uma ala de sonhos terminais. Moribundos, eles nos olham desesperados enquanto levamos a mão para, friamente, desligá-los de tudo o que os mantém ainda vivos. Morram, malditos, morram e não nos pertubem mais com essa estória de futuro promissor. Promissor o cacete, para o diabo que os carregue, infelizes. O futuro chegou e continuamos a nos arrastar, almas penadas que somos. As feridas não cicatrizam com o tempo, apenas infeccionam, doendo ainda mais. Que não nos ofereçam analgésicos, pois é a nossa dor! Não permitamos que até isso tirem de nós.

Em uma vala qualquer de um terreno baldio, os abandonamos. Sonhos bastardos, mutilados, infelizes. Bestas deformadas a nos povoar os pesadelos. Ainda respiram, mas pouco importa. Aí vem chuva, que morram afogados... que um raio lhes caia na cabeça. Não poderão mais nos importunar, não hoje, não agora.

No próximo bar, pedimos uma cerveja. Não precisamos mais olhar à frente. Acabou. 






2 comentários:

Fabrício Andrade disse...

Companheiro, que texto pesado. Mas é real. Os tais sonhos que tanto nos incomodam. Eu mesmo sofro com os sonhos belos, de futuro promissor, como você diz. Futuro que não chega. E acredito que a sensação de absoluta vitória nunca chega a ninguém, porque nunca estamos satisfeitos. Parece que o outro é que é feliz, mas pergunte pra ele se de fato é. Valeu, Laurindo. Um abraço.

Laurindo Fernandes disse...

Sempre bom ter você por aqui. Pois é, a grama do quintal do vizinho sempre parece mais verde, não é? Obrigado pela visita.