quarta-feira, 17 de março de 2010

Tevê



Muito se tem falado da burrice do povo, a qual se atribui o péssimo hábito de preterir as coisas boas às ruins. Então se aproveita o embalo para pôr a culpa nos meios de comunicação para, enfim, culpar a televisão. Sim, ela é a culpada por sermos invadidos por tanto lixo. Músicas de má qualidade, programas de mal gosto, informação irrelevante etc. Maldita televisão que a todos emburrece diuturnamente.

Aqui reside um paradoxo: a programação é ruim porque nós gostamos de coisas sem qualidade ou gostamos de porcarias porque a programação é ruim? Por exemplo, esse “reality show” abjeto faz sucesso porque nós gostamos desse tipo de aborto intelectual ou nós gostamos porque faz sucesso? Eles querem assistir a isso, bradam as emissoras. Nós assistimos porque não tem outra coisa, vociferamos de cá.

Tem outras coisas na tevê sim, muito mais educativas, instrutivas e infinitamente mais salutares que a programação das emissoras campeãs de audiência. Está tudo aí, a sua frente, a um clique. Isso. Um clique e optamos por assistir outra coisa em outro canal. Ou desligar a televisão e ir ler um livro. Mas então porque não fazemos isso? Porque nos curvamos perante tanto lixo?

Este é o ponto ao qual se apega o pessoal da televisão. Em uníssono dizem que as pessoas assistem porque querem, porque gostam, pois coisa melhor certamente está passando em outro canal. Ora, se a tevê vive de propaganda, se a propaganda é paga conforme o número de telespectadores que um programa consegue alcançar, logo, procura-se manter a família toda na frente da tevê. Por isso, se é lixo que os mantêm entretidos, lixo neles!

Mas isso exime a televisão de culpa? Justificaríamos assim a enorme quantidade de dejetos levadas ao ar todos os dias? Não, não justifica. Explica, mas não justifica. Sabedora que é dessa queda que temos por coisas ruins, sabedora também de que isso muito nos empobrece cultural e politicamente, não deveria a galera da tevê nos dar o que queremos, não. Olha, eu sei que você gosta de m****, mas eu tenho coisa melhor pra você, deveriam dizer. Veja, isso é útil, é bom, é salutar... e ir empurrando aos poucos, até que estivéssemos acostumados a não ingerir mais essas porcarias.

Deveria-se pensar na função social da programação televisiva. Aliás, deveria-se fazer cumprir o disposto no art. 221, inciso I, de nossa Constituição Federal: "A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas".  Quem sabe assim, fazendo valer a força da lei, os meios de comunicação priorizariam o fomento da educação e cultura do povo. Mas pensa-se apenas no dinheiro. Quanto mais gente na frente da tevê, melhor para os bolsos das emissoras. Lixo neles de novo.

De nossa parte, podemos protestar de uma maneira bem simples e eficaz: mudando de canal. Ou ainda, desligando a tevê. Nos desligando da tevê. Um a um, os televisores do país seriam, aos poucos, inutilizados. As audiências caindo vertiginosamente. Estancaríamos em nossas salas o desemboque da podridão televisiva. Se o que eles querem é que fiquemos assistindo essas porcarias todas, nosso protesto será não as assistirmos mais. Desempoeiremos nossos livros. Desenferrujemos nossa mente.

Façamos um novo tempo.


3 comentários:

Fabrício Andrade disse...

Laurindo, excelente reflexão. Quanto à Constituição já há a norma que você sugere. Veja: Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 3º - Compete à lei federal:
II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.
Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

É lamentável que isso só fique no texto. Vão dizer que se trata de norma de eficácia limitada, aquela velha ladainha de que precisa de lei para regulamentar...
Um abraço.

Laurindo Fernandes disse...

Professor Fabrício, tomei a liberdade de usar teu comentário para refazer o parágrafo do texto que propunha uma emenda constitucional,rsrs. Obrigado pelo auxílio e esclarecimento, sempre muito oportuno. Abraços.

Anônimo disse...

Laurindo, três meses de silêncio, por onde andas?! saudades dos escritos teus. Sempre interessantes e tão bem feitos! Abraços.