terça-feira, 25 de outubro de 2011

PIÁ

Mamãe é “mamá”.
Papai é “papá”.
Irmã é “maná”.

Mamá é o leite,
que alimenta,
que mata a sede.

Papá é a comida,
que alimenta,
que mata a fome.

Maná é o pão do céu!
É o alimento da alma.
Algodão doce de nuvens.

E cresce o piá.
Como cresce.
Crescemos também.

Em responsabilidade.
Em amor.
Crescemos em paz.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Do tempo

Elevei-me de seu amor ao ápice embriagante
Em óbice à solidão de minhas noites
Repleto de esperanças  atirei-me crente
Que de tal amor não levaria açoites.

Mas tão logo dei por mim assim estava
Genuflexo abatido outra vez ao solo
De ti nem uma palavra ou um gesto nada
Apenas negaste ao enamorado o colo.

O tempo passou inexoravelmente
E agora ao te ver não inebriante
Não entendo onde meu coração estava.

O tempo faz-nos isto, está em seu cerne
De um sentimento atroz uma lufada
Ao ver-te hoje, o ontem tudo, fez-se nada.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Entardecer

                                Da varanda olhava a rua, era tarde. Algumas crianças corriam de lá pra cá num ir e vir sem fim. Lembrou-se de seus filhos. A correria e algazarra que tanto o irritavam. Molecada infernal dos diabos. Odiava. As vezes chegava com algum negócio mal resolvido e encontrava a meninada na rua no corre-corre típico das crianças saudáveis. Entrava em casa e chamava os seus, que vinham cabisbaixos sabendo que era pêia na certa. Dava-lhes uma sova das boas. Ora essa, filho meu a essa hora na rua? Mas nem. E a cinta cantava nos lombos dos infelizes.

            Agora, achava graciosa a inquietude das crianças. Também, a essa altura do campeonato, não haveria nada que o pudesse mais aborrecer. O sol se punha, sendo tragado lentamente pela noite. Os anos passaram e os filhos se foram, um para cada lado. A esposa sucumbira à idade e enfermidades várias que a abateram ao longo da jornada. Enfim, só.

            Podia agora pensar que perdera tempo. Se lhe fosse permitido voltar atrás, o que faria? Ah, vai saber. Talvez agisse da mesma maneira. Talvez sofrer não faça as pessoas mudarem. Pelo menos não pra melhor. Por isso chamamos de amarguras da vida aqueles reveses da sorte que em algum momento estalam a mão espalmada em nossa cara. Amarguras, não doçuras. Ora, não há de se querer que o espírito fique doce após ser tomado pelo fel da dor.
           
            Mas era tarde e o sol despencava no horizonte. A gurizada elétrica na rua. Menos um dia na face desta terra. A noite chegou.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

E depois de Angélica...



                     Em recente entrevista concedida a revista Veja, ao falar do começo de sua carreira, a apresentadora Angélica pergunta ao jornalista: “Você conhece Ariquemes? Fica no fim do mundo, à direita”. Essas palavras geraram alguma indignação no povo rondoniense, e por aquela semana, muitos apresentadores de programas locais teceram comentários a respeito do que ela disse, nas escolas os professores comentaram com os alunos, era o assunto das rodas de amigos. Ariquemes fica aqui, em Rondônia, que na concepção da apresentadora, é o fim do mundo. Ninguém gostou da comparação.
            Agora, temos rolando aí na rede um vídeo, onde o apresentador Rafinha Bastos detona o povo rondoniense. No vídeo, que foi gravado numa das apresentações do show “A arte do insulto”, o humorista fala da feiúra do povo rondoniense, e aconselha que usemos isso ao nosso favor, trazendo para cá as pessoas que estão se sentindo mal, para que elas, ao ver-nos, se sintam melhores. Depois diz que já sabe onde o cantor Belo nasceu, já que ele devia se chamar de feio-pra-cacete. Numa parte da apresentação onde ele diz que estava assistindo tevê de madrugada e, num desses programas evangélicos, um homem estava possuído pelo demônio, e este falava através daquele, em português. Rafinha então teve um estalo: se o diabo fala português, então já sabia de que estado ele vinha: Rondônia. Acrescenta ainda que aqui o encardido deixou muitos filhos. “Se Deus é brasileiro, saibam que ele sacaneou Rondônia.” 
            Domingo último, dia 10, eu estava assistindo uma reprise do programa “Quinta categoria” na MTV. Em um dado momento, é escolhido um participante, que tem sua história recontada no palco, pelos apresentadores. Dessa vez, o escolhido foi um jovem que queria ser ator, e era do Acre. Na seqüência, os atores começam a encenar de improviso, a história do rapaz que veio do Acre, com o intuito de ser ator. E a humorista Tatá Werneck começa: “Da ilha do Lost, chamada Acre, fulano sonha em ser ator. Ele e sua companheira macaca Jane”. Não me recordo muito bem se o nome dado a macaca foi este mesmo, nem o nome do rapaz, mas não me esqueço da comparação entre o Acre e a Ilha do Lost.
            Olhando esses últimos comentários a respeito desses dois estados da região norte, Acre e Rondônia, percebe-se a imagem que ainda se tem de nós na região sul e sudeste: aqui é o fim do mundo, mais longe que a ilha do seriado Lost, onde homens sonham em ser mais que selvícolas, cujos animais de estimação são macacos. Moramos num estado tropical sacaneado por Deus. Feios feito o diabo. Uma viagem a nosso estado deveria ser receitada às pessoas com problemas de baixa estima; elas se sentiriam melhor ao ver o quanto somos feios.
            Poderia se dizer que nos casos do Rafinha Bastos e do Programa Quinta Categoria, por tratarem-se de programas humorísticos, há de se levar na esportiva, e rir junto, e muito, com a platéia. Mas eu, particularmente, não sou adepto ao humor a qualquer custo, na base da ofensa, do humor pejorativo, calcado no preconceito. Existem outras maneiras de fazer humor, e isso outros tantos humoristas tem demonstrado, pois o fazem sem ofender a ninguém.
            A meu ver, não teve graça nenhuma.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Aquela manhã de 86


Naquela manhã de um dia de fevereiro de 86 ele acordou sentindo-se melhor. O sol adentrava o quarto onde convalecia. Cinco dias já. Agora a primeira melhora. Sentou-se na cama, espalmou a mão no peito, pressionou... estava melhor. Cinco dias, cinco longos dias. Se animou: era dia de visita! Provavelmente ganharia alta e iria com a esposa para casa lá na chácara. Que alegria dos meninos ao vê-lo chegar bonzinho da silva. Levantou-se, sentiu alguma tontura - talvez por causa dos remédios, talvez fraqueza mesmo – e deu dois passos. Parou e inspirou o ar, bem fundo. Estava bom. Aleluia.

            Mas sentiu uma pontada aqui embaixo, na boca do estômago que foi subindo, transformando-se numa queimação no peito, ao mesmo tempo em que as vistas escureciam. A garganta fechou como que por um laço. Na boca um amargor. Uma tonelada a cabeça. Tonteou e caiu aos pés da cama, com os olhos arregalados voltados em direção a porta. A enfermeira da manhã encontrou-o assim. Abaixou-se, pôs dois dedos sobre a jugular dele e constatou o óbito.  A esposa levou para casa naquele dia, como ele havia imaginado. Mas não teve alegria de meninos, não teve. Não teve graça.
            Quem for ao cemitério da cidade não encontrará seu jazigo. Ele foi sepultado ali, próximo a capela, onde tem várias covas sem denominação alguma. Uma delas pode ser a dele, mas qual? A família não colocou nenhuma cruz. Não foi feito nenhuma alvenaria para marcar o lugar. Enterraram-no e o esqueceram.
            Vai para mais de vinte anos, quase vinte e cinco. Enquanto observava aquele quadrante onde ele provavelmente foi sepultado, inevitavelmente imaginei a mim mesmo ali, sob a terra úmida. Quantos planos naquela longínqua manhã de fevereiro de 86 e isto: uma cova sem nome. Um sepulto anônimo, esquecido.
            E você? E eu? Vinte e tantos anos após nosso passamento, que restará de nós? Estará alguém a olhar um jazigo sem nome também, onde formos sepultados? Alguém se lembrará?
           
            Vinte anos, quase vinte e cinco...

quarta-feira, 17 de março de 2010

Tevê



Muito se tem falado da burrice do povo, a qual se atribui o péssimo hábito de preterir as coisas boas às ruins. Então se aproveita o embalo para pôr a culpa nos meios de comunicação para, enfim, culpar a televisão. Sim, ela é a culpada por sermos invadidos por tanto lixo. Músicas de má qualidade, programas de mal gosto, informação irrelevante etc. Maldita televisão que a todos emburrece diuturnamente.

Aqui reside um paradoxo: a programação é ruim porque nós gostamos de coisas sem qualidade ou gostamos de porcarias porque a programação é ruim? Por exemplo, esse “reality show” abjeto faz sucesso porque nós gostamos desse tipo de aborto intelectual ou nós gostamos porque faz sucesso? Eles querem assistir a isso, bradam as emissoras. Nós assistimos porque não tem outra coisa, vociferamos de cá.

Tem outras coisas na tevê sim, muito mais educativas, instrutivas e infinitamente mais salutares que a programação das emissoras campeãs de audiência. Está tudo aí, a sua frente, a um clique. Isso. Um clique e optamos por assistir outra coisa em outro canal. Ou desligar a televisão e ir ler um livro. Mas então porque não fazemos isso? Porque nos curvamos perante tanto lixo?

Este é o ponto ao qual se apega o pessoal da televisão. Em uníssono dizem que as pessoas assistem porque querem, porque gostam, pois coisa melhor certamente está passando em outro canal. Ora, se a tevê vive de propaganda, se a propaganda é paga conforme o número de telespectadores que um programa consegue alcançar, logo, procura-se manter a família toda na frente da tevê. Por isso, se é lixo que os mantêm entretidos, lixo neles!

Mas isso exime a televisão de culpa? Justificaríamos assim a enorme quantidade de dejetos levadas ao ar todos os dias? Não, não justifica. Explica, mas não justifica. Sabedora que é dessa queda que temos por coisas ruins, sabedora também de que isso muito nos empobrece cultural e politicamente, não deveria a galera da tevê nos dar o que queremos, não. Olha, eu sei que você gosta de m****, mas eu tenho coisa melhor pra você, deveriam dizer. Veja, isso é útil, é bom, é salutar... e ir empurrando aos poucos, até que estivéssemos acostumados a não ingerir mais essas porcarias.

Deveria-se pensar na função social da programação televisiva. Aliás, deveria-se fazer cumprir o disposto no art. 221, inciso I, de nossa Constituição Federal: "A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas".  Quem sabe assim, fazendo valer a força da lei, os meios de comunicação priorizariam o fomento da educação e cultura do povo. Mas pensa-se apenas no dinheiro. Quanto mais gente na frente da tevê, melhor para os bolsos das emissoras. Lixo neles de novo.

De nossa parte, podemos protestar de uma maneira bem simples e eficaz: mudando de canal. Ou ainda, desligando a tevê. Nos desligando da tevê. Um a um, os televisores do país seriam, aos poucos, inutilizados. As audiências caindo vertiginosamente. Estancaríamos em nossas salas o desemboque da podridão televisiva. Se o que eles querem é que fiquemos assistindo essas porcarias todas, nosso protesto será não as assistirmos mais. Desempoeiremos nossos livros. Desenferrujemos nossa mente.

Façamos um novo tempo.


segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Xis

Folheando o livro didático de minha filha pude observar a letra xis quando manuscrita em maiúscula. Da base da linha subimos a ponta da esferográfica em forma de meia lua, descendo novamente, e de novo subindo, em outra meia lua, espelho da primeira e temos um xis. Duas meias luas que se tocam. Achei legal nem sei porquê. Isso foi a umas duas horas e de lá pra cá tenho pensado no xis. Tenho pensado em sua polivalência. Um camaleão esse xis.

Por exemplo de sua versatilidade, vejamos os nossos amigos cientistas. Quando descobrem uma nova substância, a qual ainda não tiveram tempo de dar um nome definitivo, do que a chamam? Eis que descobriram a substância xis. Pra que serve tal substância? Ora, ainda não sabemos, mas provavelmente terá xis utilidades.

Sim senhores, temos aí mais uma das ocupações do nosso amigo xis: quando não sabemos quantificar alguma coisa, dizemos que tal coisa tem xis unidades. Não pude deixar de lembrar das equações polinominais onde nos pedem, na maioria das vezes, que descubramos o valor de xis. Lembro-me de um infeliz episódio onde a nobre professora substituiu o xis por outra letra qualquer. Surpresa por receber as questões em branco de determinado aluno, deste ouviu, estupefata, a justificativa de que o jovem só sabia resolver equações com xis. Não sabia equacionar com outra letra.

Agora temos uma avalanche de filmes inspirados em quadrinhos de super heróis. E umas das franquias de maior sucesso é a dos X-men. Olha aí o nosso amigo xis! Wolverine, um dos mutantes a alcançar mais prestígio entre os cinéfilos, é chamado de Arma X. Arma xis. O professor que tenta encaminhar os mutantes é o professor X. Pensa que chato seria se a arma fosse a Arma B, ou P. Como o xis lhe ficou bem, não é?

Falei logo lá no começo da sinuosidade da letra xis manuscrita, e logo ali em cima, dei-me conta da impetuosidade desta em caixa alta. X. Duas linhas diagonais que surgem da base de um quadrilátero imaginário e se cruzam de forma que todas as hastes a partir da interseção de tais linhas tenham o mesmo tamanho. Ufa!

Na hora da foto, lá está o xis, que todos pronunciam para o sorriso ficar bonito. Experimente dizer um A na hora da foto, ou um O. Não dá, tem que ser o xis.

Metido que só ele, sempre está no xis da questão. É o ponto crucial, é o nó que desatará todos os nós, é o xis. Resolvido este, o resto é fichinha. Colocado entre dois números, os faz multiplicarem-se um pelo outro, tanto faz a ordem em que isso ocorra. AxB. A vezes B. Entre dois lutadores, transforma-os imediatamente em adversários. AxB. A versus B. 

Em se tratando de cartografia, lá está ele, indicando o lugar do tesouro. Porque não o fazem com um D ou um U, sei lá? Não, tem que ser ele, o xis.

Quanto a mim, dos textos que escrevo, vou marcando com um xis os que já publiquei aqui no blog. Ao fazer compras também uso e abuso do xis; ao marcar os bingos da vida por aí, idem.





E nos contratos? Sempre tem alguém que faz um xis onde é para a gente assinar. Tem gente que já imprime o contrato com o xizinho lá, estrategicamente localizado. Por favor, estou te mandando uns papéis. Assine onde estiver um xis.


Ah, lembrei-me de um cabra que ficava ofendido quando faziam um xis onde ele tivesse que assinar. Achava que era um insulto a sua capacidade de discernimento. Então, sempre que era preciso mandar-lhe algum papel para que assinasse, eu fazia um xis em negrito, sublinhado, itálico... e em vermelho. 

domingo, 31 de janeiro de 2010

Menino


Na serraria, todo sábado era dia de pagamento. O menino começara naquela semana e iria receber pela primeira vez. Era seu primeiro emprego, aos doze anos. Ganharia  alguns cruzeiros por semana, menos que a metade que pagavam a um adulto. 

Mas ele já tinha olhado lá na mercearia o que dava pra comprar: uma bola dente-de-leite e um carrinho de plástico, com rodas de verdade. Não se desfaria de seu caminhãozinho de madeira com cabines e molejos de lata de óleo e pneus recortados de chinelos. Carrinho e bola ele não tinha não.

Viu outros carrinhos de metal que abriam as portas e o capô, mas eram muito caros. Viu também bolas em couro, mais caras ainda que os tais carrinhos metálicos com portas e capôs móveis. Iria de dente-de-leite mesmo e carrinho de plástico.

Recebeu e se mandou para a mercearia, dali a pouquinho já estava no portão de casa. A mãe fazendo o almoço no fogão a lenha que ficava num puxadinho encostado na casa de madeira. O menino entregou a ela a sacola com o resultado de sua semana de trabalho.
  
A mãe apanhou a sacola. Não estavam ali a bola nem o carrinho que ele dissera que compraria: ali estavam um frango e um quilo de batatas.




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terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Renúncia



Olho à frente e não vejo o futuro. O hoje é o passado de amanhã: vivemos no pretérito. Hoje colhemos as decepções e amarguras de tudo o que poderíamos ter realizados e não o fizemos. Deixamos para depois, sem perceber que o depois é agora. Estamos no depois. Depois de tudo o que passamos, depois de tudo o que passou por nós. Todas as oportunidades desperdiçadas. Tantos sonhos mortos, meu pai.

Em que momento renunciamos e nos deixamos arrastar pela vida cabisbaixos, pensativos no que poderia ter sido, e não foi? Parece-me que morrer não é deixar de viver. Morrer é, antes de tudo, deixar de sonhar, que antes de ser uma morte, é uma traição: é trair-se a si mesmo, condenando-se a morte todos os dias.

Somos uma ala de sonhos terminais. Moribundos, eles nos olham desesperados enquanto levamos a mão para, friamente, desligá-los de tudo o que os mantém ainda vivos. Morram, malditos, morram e não nos pertubem mais com essa estória de futuro promissor. Promissor o cacete, para o diabo que os carregue, infelizes. O futuro chegou e continuamos a nos arrastar, almas penadas que somos. As feridas não cicatrizam com o tempo, apenas infeccionam, doendo ainda mais. Que não nos ofereçam analgésicos, pois é a nossa dor! Não permitamos que até isso tirem de nós.

Em uma vala qualquer de um terreno baldio, os abandonamos. Sonhos bastardos, mutilados, infelizes. Bestas deformadas a nos povoar os pesadelos. Ainda respiram, mas pouco importa. Aí vem chuva, que morram afogados... que um raio lhes caia na cabeça. Não poderão mais nos importunar, não hoje, não agora.

No próximo bar, pedimos uma cerveja. Não precisamos mais olhar à frente. Acabou. 






quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Ordinário

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Lendo o texto anterior, não pude deixar de lembrar do adjetivo “ordinário”, que também é considerado pejorativo, mas que a princípio, significava habitual, que não fugia a ordem normal das coisas. Hoje é usado mais num sentido depreciativo. Quando se quer dizer que algo é de baixa qualidade, ou sem nenhuma, diz-se que é ordinário. Habitual, ordinário, ruim, desqualificado. Um passo a frente quem quer algo mais, buscando sempre o extraordinário, o fora do lugar comum.


A palavra chave é essa: comum. Não queremos um tratamento comum, não queremos coisas comuns. Vidas comuns. Não aceitamos ser pessoas comuns. Não queremos ser ordinários. Queremos ser mais.


Mais uma palavra que se transformou com as mudanças de perspectiva de nossa sociedade. O comum, usual, não basta. Perde o valor o homem comum, com suas expectativas comuns a outros homens igualmente comuns. Abaixo a rotina de querer as mesmas coisas, ter os mesmos sonhos. Fora com o cotidiano de nosso torpor existencial. Que não nos cubram as cinzas de uma vida sem glórias nem derrotas. Uma vida ordinária, onde todas as coisas estejam exatamente nos mesmos lugares que estão em outras vidas igualmente ordinárias.


Mas para romper essa barreira também não é fácil. Suplantar tal obstáculo, exceder às expectativas, buscar pelo extraordinário e o encontrar. Árdua batalha, mas entre manter-se em pé e lutar e deitar-se e fazer força para morrer, escolhamos a primeira opção.


Garantia nenhuma nos é dada de que conseguiremos algo além do comum e esperado. Talvez em vão nos debateremos por uma vida para, ao fim, ver que fomos exatamente o que poderíamos ser, sem nos superarmos em nada. Veremos então que apenas seguimos a banda, dançando conforme a música, sendo apenas o que foi nos permitido ser.


Uma pena.